Resposta do Rio Atmosférico à Perda de Gelo no Ártico
- APECS PT
- 15 de out. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 23 de nov. de 2021
Nos dias de hoje, muito se fala das alterações climáticas e das suas consequências. Por exemplo, o aumento da temperatura média global, surgimento de eventos raros e extremos de precipitação, secas severas, o degelo das geleiras e das calotes polares e o consequente aumento do nível médio das águas do mar.
Os Rios Atmosféricos (ARs – Atmospherics Rivers), são estruturas de transporte de grandes quantidades de humidade na atmosfera. Foram equiparados aos rios terrestres, como o rio Amazonas que é o mais caudaloso do mundo, daí a origem do nome. Segundo o glossário meteorológico da American Meteorological Society (AMS), os ARs são corredores longos, estreitos e transitórios de intenso transporte horizontal de vapor de água, normalmente encontrados na baixa troposfera, associados às frentes frias de ciclones extratropicais. Em meados de 1970 já se falava de fenómenos com características similares, mas foi só em 1990 que foram denominados como “Rio Atmosférico”.

As secas prolongadas e as inundações são evidências claras das alterações climáticas que podem estar intimamente ligadas aos ARs. Os ARs são responsáveis pelo transporte de grande quantidade de humidade das regiões tropicais e extratropicais para latitudes mais elevadas e zonas polares, representando cerca de 90% do transporte de humidade dos trópicos para as zonas polares. São encontrados tanto no Hemisfério Norte como no Hemisfério Sul, onde podem intensificar a precipitação e causar inundações e deslizamentos de terra. Como uma componente importante do ciclo hidrológico, representam um forte contributo no reabastecimento e na redistribuição da água nos rios terrestres e nos lençóis freáticos, no teor de humidade dos solos e até na espessura das camadas de neve em regiões montanhosas e polares. Nas regiões polares os ARs são também responsáveis pela formação de grandes polinias, que são áreas onde se esperava encontrar gelo marinho, mas que estão descongeladas como resultado do transporte de humidade dos trópicos e extratrópicos.
O fenómeno de amplificação do Ártico refere-se ao aquecimento do Ártico cerca de duas ou três vezes mais rápido que o resto do globo, resultando numa diminuição da extensão do gelo marinho. A perda do gelo do Ártico pode influenciar o clima nas latitudes médias. O clima do hemisfério norte sofreu várias mudanças evidentes, com reduções na quantidade de precipitação anual, secas prolongadas em algumas regiões, aumento de fenómenos extremos de precipitação e aumento da frequência dos ciclones tropicais e extratropicais, entre outras.

Como é que os ARs respondem à perda de gelo no Ártico?
Para melhor entender esse aspeto, que é ainda pouco fundamentado na literatura, realizou-se um estudo na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos da América. Neste estudo, os investigadores usaram algoritmos de deteção dos ARs, que estimam a quantidade do vapor de água transportado na atmosférica, forçados por modelos climáticos atmosféricos que consideram a perda do gelo do Ártico. Os investigadores modelizaram o Hemisfério Norte durante o inverno que coincide com a passagem de muitos ciclones tropicais e extratropicais, estando assim associado a um maior número de ARs. A resposta da frequência dos ARs à perda de gelo do Ártico equivale ao aquecimento global de 2°C, segundo este estudo. Em termos de variação regional, os investigadores concluiram que sobre o Pacífico Norte os ARs se estendem para nordeste e ocorrem mais perto da costa oeste da América do Norte. Sobre o Atlântico Norte, os ARs deslocam-se para o equador. A resposta dos ARs em latitudes médias é governada principalmente pelas mudanças no vento. Acima de 60°N de latitude, o enfraquecimento do vento tende a reduzir a frequência dos ARs enquanto que o aumento da humidade da atmosfera (devido à perda de gelo marinho) tende a aumentar a frequência dos mesmos, resultando em mudanças relativamente pequenas nos ARs.
Por outro lado, outros fenómenos associados às alterações climáticas podem contribuir para as mudanças dos ARs, como mudanças na temperatura a superfície do oceano por exemplo. A amplificação do Ártico tem motivado uma maior frequência de eventos extremos e dos ARs, que tem modificado o clima das latitudes médias, incluindo entre outros eventos extremos de precipitação, invernos mais rigorosos, assim como secas prolongadas e desertificação.
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Fonte: Ma, W., Chen G., Peings Y., Alviz, N., Atmospheric River Response to Arctic Sea Ice Loss in the Polar Amplification Model Intercomparison Project, Geophysical Research Letters 48:20, e2021GL094883 (2021). DOI: 10.1029/2021GL094883.
Autora: Cátia Lavinia Gonçalves
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